Divisor de Inércia à Torção e Capacidade de Adaptação Plástica em Vigas

O estudo e consideração dos esforços de torção em elementos de concreto armado sempre suscitaram muitas discussões e dúvidas do tipo:

  • Quais situações podemos desprezar a torção?
  • Qual inércia à torção devemos considerar em vigas de seção transversal retangular?
  • Qual o formato do estribo para resistir à torção?
  • Como projetar a viga para que tenha capacidade de adaptação plástica?

Vamos abordar alguns desses assuntos nesta mensagem.

Podemos, simplificadamente, classificar a colaboração de vigas de concreto armado resistindo à torção em quatro casos distintos:

a) Vigas que não necessitam dos esforços de torção para seu equilíbrio estático;

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Figura 1 – Exemplo de torção de compatibilidade

b) Vigas que necessitam, obrigatoriamente, dos esforços de torção para seu equilíbrio estático;

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Figura 2 – Exemplo de torção de equilíbrio

c) Vigas com torção que possuem laje em ambos os lados;

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Figura 3 – Exemplo de torção que não é de compatibilidade

d) Vigas que ficam numa situação intermediária, isto é, a torção não é necessariamente obrigatória para o equilíbrio, mas ela precisa, em trechos localizados, possuir uma determinada capacidade de adaptação plástica à torção. A NBR6118:2007, no item 17.5.1.2, diz que ”quando a torção não for necessária ao equilíbrio, caso da torção de compatibilidade, é possível desprezá-la, desde que o elemento estrutural tenha a adequada capacidade de adaptação plástica e que todos os outros esforços sejam calculados sem considerar os efeitos por ela provocados. Em regiões onde o comprimento do elemento sujeito a torção seja menor ou igual a 2h, para garantir um nível razoável de capacidade de adaptação plástica, deve-se respeitar a armadura mínima de torção e limitar a força cortante, tal que: VSd ≤ 0,7 VRd2”.

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Figura 4 – Exemplo de trecho de viga com comprimento (a) menor ou igual a duas vezes a altura (h)

Segue abaixo, uma explicação resumida de como tratar esses itens no TQS V17. Para facilitar, iremos dividir em dois tópicos: divisor de inércia à torção para os casos (a) , (b) e (c) acima, e  capacidade de adaptação plástica, caso (d).

1. Divisores de inércia à torção

A rigidez à torção de vigas de concreto armado, nos sistemas TQS, pode ser desprezada/diminuída inserindo redutores (divisores) na inércia teórica à torção desses elementos. Esses redutores podem ser definidos nos critérios gerais de pórtico e grelha ou nos dados gerais da viga (modelador estrutural). Quando este redutor (divisor) é definido como sendo o valor 100, a torção é desprezada, independente do valor do momento torçor. Se o valor for definido como sendo 1 (um), a torção será considerada como sendo integral. Redutores com valores intermediários são definidos também na Norma NBR 6118, que permite utilizar 15% da rigidez elástica à torção, o que equivale a um divisor de torção com o valor de 6,67. Quando se aumenta o valor do redutor, os esforços de torção, normalmente, diminuem e os deslocamentos crescem.

Esta adoção de redutores na inércia à torção não pode ser realizada arbitrariamente. Para descobrir se a torção na viga é necessária ao equilíbrio da estrutura, é de fundamental importância o exame cuidadoso dos diagramas de momento fletor, momento torçor, cortante e deslocamento nos modelos analisados (pórtico e grelha).

1.1.) Nos critérios gerais de pórtico e grelha

O usuário dos sistemas TQS pode definir os valores dos redutores de inércia à torção tanto para todas as vigas de um projeto, como para uma viga específica de um determinado pavimento. O sistema permite a definição destes redutores através dos critérios gerais de projeto para os sistemas de pórtico e grelha, independentemente da alimentação dos dados das vigas. Assim, todas as vigas do projeto terão, por default, o valor assim definido:

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Figura 5 – Definição do divisor nos critérios de pórtico e grelha

Neste exemplo foi utilizado divisor de inércia à torção igual a <100> para ambos os modelos, que implica em desprezar toda e qualquer torção nas vigas.

No Modelo IV (modelo de cálculo de solicitações, onde no pórtico espacial a laje é simulada por um diafragma rígido) podem ser definidos valores diferentes de redutores nos critérios gerais de pórtico e grelha. Entretanto, observe que ao definir redutores diferentes para grelha e pórtico, podemos obter diferentes modelos ao analisarmos as deformações no Grelha Não-Linear, considerando a armadura que foi dimensionada/detalhada nas vigas, pois os esforços considerados no dimensionamento dessas foram extraídos dos resultados do processamento do pórtico espacial.

Para o Modelo VI (modelo de cálculo de solicitações onde a laje faz parte do modelo completo do pórtico espacial) o divisor somente pode ser editado nos critérios gerais do pórtico espacial.

1.2.) No Modelador Estrutural

O Modelador Estrutural dos sistemas TQS é a principal ferramenta para definição dos dados das vigas, incluindo geometria, cargas, comportamento estrutural, etc. Neste Modelador Estrutural, podemos definir para cada viga isoladamente, no comando <Dados Gerais da Viga>, um comportamento diferente frente à torção. Temos duas situações distintas:

1.2.1.) Associações de coeficientes redutores gerais

Todas as vigas que estiverem com a opção <Critérios de pórtico/grelha> selecionada nos dados gerais da viga (ver figura abaixo), no modelador estrutural, terão a inércia teórica à torção dividida pelo valor definido nos critérios gerais de pórtico e grelha (figura 5), em cada respectivo modelo. Neste exemplo, foi utilizado divisor de inércia à torção igual a <100> para ambos os modelos.

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Figura 6 – Divisor definido em <Critérios de pórtico/grelha> nos dados gerais da viga no Modelador Estrutural

1.2.2) Fornecimento específico no modelador estrutural

O divisor de inércia à torção também pode ser definido diretamente no modelador estrutural, selecionando a opção <Abaixo> e digitando o valor no campo <Divisor de inércia à torção>, como pode ser visto na figura a seguir. Neste caso, o valor digitado substitui os valores definidos nos critérios gerais de pórtico e grelha apenas para esta viga. Neste exemplo, foi utilizado divisor igual a <1>.

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Figura 7 – Divisor definido em nos dados gerais da viga no Modelador Estrutural

Observe que para essa opção não é possível editar valores diferentes para pórtico e grelha, pois o valor do divisor digitado será o mesmo para os dois modelos.

2. Capacidade de adaptação plástica

Conforme o item 17.5.1.2 da NBR6118: 2007, a capacidade de adaptação plástica em elementos lineares, com comprimento menor ou igual a duas vezes a altura, pode ser garantida a um nível razoável, respeitando a armadura mínima de torção e limitando a força cortante, tal que VSd ≤ 0,7 VRd2.

O Modelador Estrutural do TQS emite o aviso mostrado abaixo, ao fazer a consistência da planta, quando um trecho de viga possui essa relação de dimensões (compr. ≤ 2H):

“Trecho da V1 com comprimento menor que 2H indica que deve ser marcada para verificação de capacidade de adaptação plástica à torção ou com inércia à torção para dimensionamento”.

Então, em obediência a NBR6118, deve-se marcar esse trecho da viga para que seja feita a verificação da capacidade de adaptação plástica, clicando em <Sim> na opção <Capacidade de adaptação plástica> nos dados gerais da viga, como mostrado a seguir:

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Figura 8 – Definição de Capacidade de adaptação plástica como <Sim> nos dados gerais da viga no Modelador Estrutural

Essa opção pode ser selecionada em todas as vigas em que se desejar garantir que a mesma tenha capacidade de adaptação plástica.  Assim, o sistema irá limitar a força cortante, tal que VSd ≤ 0,7 VRd2, e irá respeitar armadura mínima de torção também.

3. Exemplo de roteiro

A) Definir divisor igual a 6,67 (15% da inércia teórica) nos critérios de pórtico e grelha.

B) Vigas com divisor de inércia à torção definido nos critérios de pórtico e grelha (figura 6). Esta opção é default do sistema;

C) Fazer o processamento global do modelo com dimensionamento de todas as vigas;

D) Verificar os digramas e deformações;

E) Estudar o momento torçor solicitante de cálculo (TSd)* de todas as vigas no Relatório Geral do TQS-Vigas, comparando-o com o valor de TRd2.

F) Digitar o valor do divisor de cada viga no modelador estrutural, conforme a classificação abaixo:

F.1) Vigas com torção de compatibilidade (caso a): divisor de torção igual a <100>;

F.2) Vigas com torção de equilíbrio (caso b): divisor de torção entre <1> e <6,67>;

F.3) Vigas com torção que não é de compatibilidade (caso c): divisor de torção igual a <6,67>;

F.4) Vigas que precisam de capacidade de adaptação plástica (caso d): divisor igual a <100> e capacidade de      adaptação plástica <Sim> (ver figura 8);

* Critérios que podem ser utilizados para comparar o valor do TSd com TRd2:

  • Se o TSd  for desprezível em relação ao TRd2, e armadura de torção calculada menor que armadura mínima, pode-se definir divisor igual a <100>;
  • Se a viga não possuir eixo reto em planta, pode-se definir divisor entre <1> e <6,67>;
  • Se o TSd não for desprezível em relação ao TRd2, pode-se definir divisor igual a <6,67>;

Vale ressaltar que este roteiro tem apenas o objetivo de orientar o engenheiro a tratar esses itens da NBR6118: 2007 nos sistemas TQS. Cada projetista pode adotar os seus parâmetros para classificação quanto à importância dos esforços de torção. Portanto, esse roteiro serve apenas como um exemplo de como definir divisores de inércia à torção e capacidade de adaptação plástica em vigas nos Sistemas TQS.