Capacidade de Carga - Estacas
Modelo de Ruptura Estaca – Solo
Um grupo de estacas forma um complexo sistema por ser formado pelo conjunto de estacas próximas entre si interagindo com o solo, altamente hiperestático pelas condições de contorno, além de ser ligado no topo pelo bloco rígido que normalmente está em contato com o solo. A transferência de cargas ocorre através das interações entre a estrutura (estacas + blocos de coroamento + superestruturas) e os solos adjacentes.
Os mecanismos envolvidos na transferência de carga dependem do modo como a estaca for carregada, ou seja, por esforço axial, lateral, de torção ou pela combinação destes. Estes serão mais complexos quanto mais complicado for o sistema de carregamento.
No SISEs serão consideradas apenas as estacas verticais carregadas axialmente e submetidas a esforços de compressão. Para estacas lançadas com pequenas inclinadas também será feita essa consideração.
A transferência da carga de compressão Ni recebida pela estaca i para o solo, se dá basicamente em duas parcelas:
- ao longo do fuste, devido ao pequeno movimento relativo entre a estaca e o solo, em função do carregamento aplicado, o qual provoca o surgimento de tensões de cisalhamento que dão origem a reação (força) Pl;
- na base da estaca, devido à pressão de contato com o solo, que também depende do movimento vertical da estaca, o qual provoca o surgimento de tensões que dão origem à reação (força) Pp.
A determinação do diagrama de transferência de carga ao longo da estaca-solo depende intimamente de como o sistema comporta no estado de ruptura. Existem vários métodos para a estimativa de ruptura do sistema estaca-solo. Escolheram-se para o SISEs os métodos Aoki-Velloso (1975) e Decóurt-Quaresma (1978), que atualmente são os utilizados e estudados no Brasil.
A seguir são descritos os métodos de cálculo de capacidade de carga lateral e de ponta que estão implementados no SISEs. Na tabela 9.1, indica-se os métodos que são recomendados para cada tipo de estaca, conforme indicado na literatura.
Tabela 9.1 - Métodos indicados para cada tipo de estaca
Método Aoki-Velloso
Este método, com base nos resultados semi-empíricos, estima o diagrama de ruptura do sistema estaca – solo. Inicialmente foi concebido com base nos ensaios de penetração estática CPT, mas através da correlação podem ser utilizados os dados do índice à penetração dinâmica SPT, o mais empregado na atualidade.
PR: Carga de ruptura do sistema estaca-solo;
PL: Carga de ruptura lateral do fuste da estaca;
PP: Carga de ruptura na base da estaca.
Para:
U: perímetro da seção transversal do fuste da estaca
rl: atrito lateral específico;
A: área da ponta da estaca;
: trecho onde se admite rl constante, sugere-se adotar para cada 1 metro
Figura 9.1 – Carga de ruptura do contato estaca – solo.
é o número de SPT obtido nas sondagens à percussão ao longo da profundidade onde será instalado a estaca. O é o atrito lateral específico de um trecho do comprimento da estaca e depende do solo e tipo da estaca empregada. Os valores de e K mais prováveis para os solos da cidade de São Paulo são apresentados na tabela abaixo:
Tipo de Terreno | K ( MPa) | |||||
Areia | 1,00 | 1,4 | Tipo de estaca | F1 | F2 | |
Areia siltosa | 0,80 | 2,0 | Franki | 2,50 | 5,00 | |
Areia silto argilosa | 0,70 | 2,4 | Pré-moldadas | 1,75 | 3,50 | |
Areia argilosa | 0,60 | 3,0 | Escavadas | 3,00 | 6,00 | |
Areia argilo siltosa | 0,50 | 2,8 | ||||
Silte | 0,40 | 3,0 | ||||
Silte arenoso | 0,55 | 2,2 | ||||
Silte areno argiloso | 0,45 | 2,8 | ||||
Silte argiloso | 0,23 | 3,4 | ||||
Silte argilo arenoso | 0,25 | 3,0 | ||||
Argila | 0,20 | 6,0 | ||||
Argila arenosa | 0,35 | 2,4 | ||||
Argila areno siltosa | 0,30 | 2,8 | ||||
Argila siltosa | 0,22 | 4,0 | ||||
Argila silto arenosa | 0,33 | 3,0 |
Tabela 9.1 – Valores dos coeficientes do Método Aoki-Velloso, ALONSO (1983).
Para estacas pré-moldadas de pequeno diâmetro, o valor F1=1,75 mostrou-se muito conservador. Por isso, Aoki (1985) faz nova proposição para o coeficiente empírico:
, onde D = diâmetro do fuste da estaca em metros.
Aoki (1996) comenta que o coeficiente pode variar entre uma a duas vezes o valor de e que, portanto, é a hipótese mais conservadora. Para estacas escavadas, segundo Aoki (1976) dependendo do maior ou menor grau de perturbação introduzido no terreno pelo processo empregado, varia entre 4,5 e 10,5 (com ). Segundo Velloso (1978) apud ABMS (2000) podem ser adotados valores para estacas escavadas com lama bentonítica.
É necessário frisar que os métodos semi-empíricos para o cálculo da capacidade de carga só podem ser aplicados aos tipos de estacas e regiões geotécnicas para os quais foram estabelecidos. Nas outras regiões onde falta caracterização científica, o importante é o levantamento do perfil do solo através da sondagem e determinação do tipo de solo pelo método tato-visual por profissionais experientes e com rigor técnico.
Para o cálculo da carga admissível deverá ser usado um coeficiente de segurança de no mínimo 2:
Método Décourt-Quaresma
Este método, ao contrário do método Aoki-Velloso (1975), parte diretamente dos ensaios SPT. Ele foi inicialmente estabelecido em 1978 para estacas pré-moldadas de cravação, mas os autores afirmam que também podem ser aplicados para outras estacas como escavadas, Strauss, Franki, etc. Este método foi revisto em 1982, 1987 e 1996 apud ABMS (2000).
O atrito lateral específico rl é obtida pela fórmula empírica:
onde 3 ≤ N≤50 em função do número de SPT;
Ou em sistema internacional:
O atrito lateral específico deverá ser multiplicado pela área de contato do fuste da estaca-solo para cada metro de profundidade. O somatório das capacidades laterais ao longo do fuste fornecerá a capacidade lateral acumulada PL.
Inicialmente os valores de número de SPT foram estabelecidos como sendo 3 o mínimo e 15 o máximo. Mas em 1982, o limite superior foi estendido para 50 para estacas de deslocamentos (cravação), embora seja difícil cravar estacas com solos granulares e número de SPT maior que 20. O interessante nesse método, é que para a estimativa de atrito lateral de ruptura, não se distingue o tipo de solo como ocorre em Aoki-Velloso (1975). Mais adiante, veremos que com a introdução de coeficientes no cálculo de carga admissível é que diferencia entre solos argilosos, siltosos, arenosos e tipo de estaca utilizada.
Já na resistência da ponta da estaca é estimado segundo tipo de solo:
onde: Ab é a área da base da estaca;
rp = C Np (tensão de ruptura da base);
é a média entre os valores de número de SPT na profundidade da ponta da estaca em estudo, o imediatamente acima e o imediatamente abaixo;
C é um fator característico do solo, ajustado através de 41 provas de carga realizadas em estacas pré-moldadas de concreto. Nas provas de carga que não atingiram a ruptura, utilizou-se a carga de ruptura convencional correspondente ao recalque de 10% do diâmetro da estaca). Seus valores básicos são:
C= 12 tf/m² para as argilas;
C= 20 tf/m² para os siltes argilosos;
C= 25 tf/m² para os siltes arenosos;
C= 40 tf/m² para as areias.
Décourt (1996) introduziu os coeficientes α e β segundo o tipo de solo e estaca:
Tipo de solo | Escavada a seco | Escavada (bentonita) | Hélice contínua | Injetadas (raiz) | Injetadas(sob pressão) |
Argilas | 0,85 | 0,85 | 0,30* | 0,85* | 1,00* |
Siltes** | 0,60 | 0,60 | 0,30* | 0,60* | 1,00* |
Areias | 0,50 | 0,50 | 0,30* | 0,50* | 1,00* |
Argilas | 0,80* | 0,90* | 1,00* | 1,50* | 3,00* |
Siltes** | 0,65* | 0,75* | 1,00* | 1,50* | 3,00* |
Areias | 0,50* | 0,60* | 1,00* | 1,50* | 3,00* |
* Valores sugeridos diante do reduzido número de dados disponíveis;
** Pode ser considerado também como solos intermediários.
Tabela 9.2 – Coeficientes do Método Décourt-Quaresma, ALONSO (1983).
Décourt (1982) propõe a utilização de quatro coeficientes parciais de segurança referentes às seguintes incertezas: Fp (de parâmetros do solo), Ff (da formulação adotada), Fd (das deformações excessivas) e Fc (das cargas). Para o atrito lateral sugere os valores Fp =1,10 ; Ff =1,00 ; Fd =1,00 ; Fc =1,20 , cuja multiplicação resulta γl =1,10 x 1,00 x 1,00 x 1,20 =1,32, adota-se γl =1,30 e para resistência da ponta Fp=1,35 ; Ff =1,00 ; Fd =2,50 ; Fc =1,20 , cuja multiplicação resulta γp =1,35 x 1,00 x 2,50 x 1,20 =4,05, adota-se γp =4,00.
Então, os coeficientes de segurança “globais” referentes às parcelas de atrito lateral será 1,3 e para a parcela de ponta fica igual a 4,0. Assim a carga admissível deve atender simultaneamente a:
Dentre os dois resultados, deverá escolher a menor dos dois, por exemplo:
Dado uma estaca escavada a seco num solo arenoso , com PL=18 tf e PP=42 tf, tem-se:
Então, 12tf (a menor) será adotada como carga admissível para as condições do solo e tipo de estaca deste exemplo.
Vale lembrar que estas expressões de cargas admissíveis são de uso exclusivo quando a ruptura lateral (PL) e ruptura na ponta (PP) são estimadas pelo método Decóurt-Quaresma, não fazendo sentido aplicar no método Aoki-Velloso ou nos outros métodos.
Método Antunes e Cabral SEFE III
Tipos de Estacas indicadas: hélice
Método para estimativa de capacidade de carga de estacas, conforme proposto por Antunes e Cabral no SEFE III em 1996 (Seminário de Engenharia e Fundações Especiais e Geotecnia). Este método é bastante empregado para estacas do tipo hélice.
Define-se então o atrito lateral específico ao longo do fuste por:
Onde a carga de ruptura lateral ao longo do fuste da estaca é dada por:
Com:
Método Philipponnat
Método semi-empírico. Correlacionado com CPT. O atrito lateral específico ao longo do fuste é dado pela relação:
A carga de ruptura lateral ao longo do fuste da estaca é dada por:
A parcela de tensão de ruptura da ponta é dada por:
E a carga de ruptura na base da estaca fica:
Com qc sendo calculado conforme indicado no método Aoki-Velloso:
Onde
Método Pedro Paulo Velloso
Método semi-empírico. Correlacionado com CPT.
O atrito lateral específico ao longo do fuste é indicado por:
A carga de ruptura lateral ao longo do fuste da estaca fica expressa por:
Onde
α: coeficiente indicado na tabela 9.7;
λ: coeficiente indicado na tabela 9.8;
fc é o atrito lateral medido no ensaio de cone, relacionado com o SPT por: , com Nspt obtido em cda camada do fuste;
a' e b' : tabela 9.10;
U: perímetro da estaca.
Tipo de estaca | α |
Cravada | 1 |
Escavada | 0,5 |
Tabela 9.7: Valores de α, Moura (1997).
Tipo de estaca | α |
Compressão | 1 |
Tração (não definido no Sises) | 0,7 |
Tabela 9.8: Valores de λ, Moura (1997).
A parcela de tensão de ruptura da ponta é expressa por:
A carga de ruptura na base é indicada por:
Onde
α: coeficiente indicado na tabela 9.7;
(estacas comprimidas, com D em metros)
β=0 (estacas tracionadas);
Se (estacas comprimidas, isto acontece se ;
D: diâmetro do fuste da estaca;
A: área da ponta da estaca;
d = 0,0356 m = diâmetro da ponta do cone do CPT;
qc é a resistência de ponta é dada por:
a, b: tabela 9.10;
De modo que qc1 é a média de qc de NSUP*D acima da ponta e qc2 é a média de qc de NINF*D abaixo da ponta. Default: Nsup = 8, Ninf = 8, ver tabela 9.9.
Tabela 9.9 Valores de bulbo definidos em arquivos de critérios.
Figura 9.2 - Critério de cálculo de carga de ponta
Tabela 9.10: Parâmetros de correlação entre o CPT e SPT de Moura (1997).
Método Alonso
Este método é baseado em medidas de ensaios de SPT-T (sondagem à percussão com medida de torque). Os valores de resistência empregados no método são de torque: Tmáx e Tmín (Tres). Detalhes sobre o ensaio de SPT-T, ver Peixoto (2001).
Conforme Magalhães (2005):
Se entrada de dados for por SPT, correlacionam-se estes com valores de torque (kgf.m) por:
Se entrada de dados for por adesão – atrito lateral (fs) em kPa, converte-se adesão para torque (kgf.m) da seguinte forma:
Se entrada de dados for por torque em (kgf.m), então:
Se (limites tabela 6.1) →
A carga de ruptura lateral ao longo do fuste da estaca é dada por:
Com
: coeficiente de correção do atrito lateral, ver tabela 9.11;
U: perímetro da estaca;
= 1m (considerando que a cada metro da camada rl seja constante);
Limite máximo de Torque (kgf.m) | 40 |
Limite inferior de bulbo | 8 |
Limite superior de bulbo | 8 |
R limite (kPa) | 250 |
Alfa Al | 0,6 |
Beta Al -> Areia = 250 Argila = 150 Outros= 200 | |
Tabela 9.11: Valores de limites de rl e do coeficiente de correção por Alonso (1996) para estaca hélice contínua. (fonte Almeida Neto, 2002).
A parcela de tensão de ruptura da ponta é relacionada com o Tmín (Tres) por:
E a carga de ruptura na base é expressa por:
Com fator de correção, tabela 9.12;
: média aritmética dos valores de torque mínimo (kgf.m) no trecho Nsup*D, acima da ponta, adotando valores nulos caso comprimento da estaca < NsupD;
: média aritmética dos valores de torque mínimo (kgf.m) no trecho Ninf*D, abaixo da ponta.
Se
As camadas abaixo da profundidade final da estaca recebem valores iguais da última camada, repetir valores para.
Como default: Nsup = 8 Ninf = 8
Tabela 9.12: Valores de (kPa/kgf.m), Magalhães (2005).
Alonso (1996) enfatiza que estas correlações dependem do local, devendo realizar ensaios de SPT-T e correlacioná-los com SPT de forma estatisticamente adequada.
Método David Cabral
Método semi-empírico específico para estaca raiz. Deve-se conhecer e considerar a pressão de injeção (p) de aplicação de golpes de ar na resistência lateral da estaca. O atrito lateral específico ao longo do fuste é expresso por:
Com : índice que depende do tipo de solo, ver tabela 9.13;
D: diâmetro do fuste da estaca em metros;
p: pressão de ar comprimido em kgf/cm²; (entre 0 e 4 kgf/cm²).
sendo dado por: Se estaca raiz, conforme Paschoalin Filho (2008):
Se estaca raiz, conforme Paschoalin Filho (2008):
Se
A carga de ruptura lateral ao longo do fuste da estaca é dada por:
A parcela de tensão de ruptura da ponta é indicada por:
E a carga de ruptura na base é expressa por:
com : índice que depende do tipo de solo, ver tabela 9.13;
Tabela 9.13: Índices e para estaca raiz, conforme Nogueira (2004).