Recalques Admissíveis

O recalque absoluto é definido pelo deslocamento vertical descendente de um elemento de fundação. A diferença entre os recalques absolutos de dois elementos de fundação é recalque diferencial. O recalque diferencial, pelo fato de impor distorções às estruturas, pode acarretar em fissuras, dependendo da sua magnitude, daí a necessidade de quantificar recalques admissíveis do ponto de vista estrutural. Mostra-se a seguir, os recalques diferenciais admissíveis preliminares para estruturas de edifícios altos de concreto armado, resultados de observações em VARGAS & SILVA (1973).


Obs.: Os números em % fora dos parênteses se referem aos edifícios estreitos (dimensão padrão menor que ) e os que estão dentro dos parênteses são para edifícios largos (dimensão padrão maior que ).


- Recalque diferencial inferior a 0,18 % (0,20 %) do vão considerado, não produzirá danos nem inclinação em prédios altos;


- Recalque diferencial inferior a 0,31 % (0,26 %) do vão considerado, dará origem a fissuras nas alvenarias, mas não gerando inclinações em prédios altos;


- Recalque diferencial inferior a 0,42 % (0,60 %) do vão considerado, dará origem a fissuras na estrutura e pequena inclinação em prédios altos;


- Recalque diferencial inferior a 0,45 % (0,80 %) do vão considerado, dará origem a fissuras na estrutura e inclinação notável; exigirá reforço de fundações.


É importante fazer uma observação de que, em alguns prédios (edifícios com 6 pavimentos no máximo) se tem verificado que mesmo com os recalques diferenciais superiores aos indicados acima, nada sofreram em termos estruturais. O conceito de recalque admissível, pelo menos para os prédios, está intimamente ligado à tradição da comunidade.


Os casos mais conhecidos no Brasil são os edifícios da orla marítima de Santos – SP, com movimentos mais próximos a corpo rígido, pois os recalques provêm de camadas de argilas subjacentes que sofrem adensamento; a camada de areia sobre a qual se apóiam os elementos de fundações diretas tendem a absorver grande parte das distorções da estrutura.


Golombek apud ALONSO (1991), cita uma palestra do prof. Milton Vargas “Recalque excessivo é questão de temperamento. Nos EUA um recalque de é um escândalo nacional; em Santos (SP) quando um prédio recalca só todo mundo fica feliz”. Hoje, em Santos esta posição está mudando, reduzindo os valores de recalques com o uso de fundações profundas, pois o temperamento do usuário de Santos está mudando. A Folha de São Paulo em 29/07/90, apud ALONSO (1991) afirma que os edifícios tortos de Santos chegam a valer 40 % do preço de mercado.


Em 1963, Bjerrum, com base no trabalho de Skempton & McDonald, publicado em 1956, propôs os limites da distorção angular para vários tipos de obra.


CHAMECKI (1958) critica a maneira como o conceito de recalques admissíveis está sendo aplicado na prática de engenharia. O recalque diferencial estimado, sem a consideração da rigidez da estrutura e cuja sua relação com o recalque diferencial real é desconhecida, é utilizado como padrão para o projeto de fundações de estruturas. Enquanto uns prescrevem para recalque diferencial admissível 1/1000 do vão, outros oferecem valores mais ousados como 1/500 e 1/300. Concluindo-se que para um mesmo valor de recalque diferencial estimado, pode o recalque diferencial real variar desde valores muito próximos a zero (estruturas com altíssima rigidez) até o valor muito próximo a do calculado (estrutura com baixíssima rigidez). Assim, um mesmo valor admissível pode oferecer desde a segurança exagerada e anti–econômica até perigo de ruína para a estrutura.


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Figura 15.1 – Recalques limites e conseqüências.



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Figura 15.2 – Distorção angular limite.




Requisitos de Norma


A NBR 6118:2014 atual, diferente da sua versão anterior, de 1978, possui uma visão de integração de todos os elementos estruturais e praticamente obriga o uso de recursos computacionais para a análise global das estruturas. Em face disso também se preocupa sobre a questão da integração estrutura-solo, resumindo superficialmente alguns itens retirados da Norma sobre o tema:


11.3.3.3 Deslocamentos de apoio

“Os deslocamentos de apoio só devem ser considerados quando gerarem esforços significativos em relação ao conjunto das outras ações, isto é, quando a estrutura for hiperestática e muito rígida”.

A maioria dos edifícios de múltiplos pavimentos em concreto armado são altamente hiperestáticos e rígidos. Ou seja, para saber se existe ou não esforços significativos, deve ser analisado a interação estrutura-solo. Vale lembrar que os esforços obtidos pela combinação de ações (permanente + sobrecarga + ventos), no caso de obtidos pela combinação com efeitos de 2ª Ordem global (Gama Z, P-Delta) sem a preocupação com a deformabilidade do solo. Esta prática poderá fornecer resultados equivocados e contra a segurança. Felizmente, na maioria dos edifícios além do coeficiente de segurança alto nas fundações, ainda existe contribuição significativa de paredes de alvenaria de vedação que funciona como biela, enrijecendo lateralmente a estrutura em contraventamento, tornando os efeitos menores que estimados (calculados). Recentemente, com exceção das paredes externas, as paredes internas em alvenaria estão sendo substituídas por sistemas mais leves, como Dry-Wall ou gesso acartonado e divisórias que não contribuem para o contraventamento, ou seja, a tendência atual é transferir todos os esforços para os elementos estruturais (sistemas laje, vigas, pilares e pilares-parede). Daí a importância do calculista em conhecer o modelo numérico utilizado e suas considerações.


22.6.3 Modelo de cálculo

"Para cálculo e dimensionamento de sapatas, devem ser utilizados modelos tridimensionais lineares ou modelos biela-tirante tridimensionais, podendo, quando for o caso, ser utilizados modelos de flexão. [...] Deverá ser avaliada a necessidade de se considerar a interação solo-estrutura."

22.7.3 Modelo de cálculo

"Para cálculo e dimensionamento dos blocos, são aceitos modelos tridimensionais lineares ou não lineares e modelos biela-tirante tridimensionais. [...] Sempre que houver forças horizontais significativas ou forte assimetria, o modelo deve contemplar a interação solo-estrutura".

14.2.2 Premissas necessárias à análise estrutural

“A análise deve ser feita com um modelo estrutural realista, que permita representar de maneira clara todos os caminhos percorridos pelas ações até os apoios da estrutura e que permita também representar a resposta não-linear dos materiais. Em casos mais complexos a interação solo-estrutura deve ser contemplada pelo modelo.”


Quando a estrutura pode ser considerada como mais ou menos complexa? O assunto é mais sofisticado do que parece, pois envolve o maciço de solo, conjunto de materiais altamente heterogêneo com difícil avaliação do módulo de deformação do solo (ESOLO), e resistência que depende do grau de saturação e efeitos das fundações mais próximas que podem gerar sobrepressões nos bulbos de tensões. Para atingir o “modelo realista” da Norma, é imprescindível a consideração da interação estrutura-solo.

Quem não se adequar ao novo conceito não se faz sentido em adquirir os softwares mais complexos, se já começa errando na concepção (condições de contorno) e tem o grande risco de acumular os erros de incerteza que envolve o fenômeno tão complexo.

O domínio do estudo da interação estrutura-solo não tem o objetivo somente em prever os possíveis esforços secundários devido aos recalques diferenciais e dimensionar a estrutura para tal. O seu principal objetivo é ajustar melhor no dimensionamento dos elementos estruturais de fundações e do edifício simultaneamente para minimizar os efeitos nocivos dos recalques diferenciais nas estruturas. E com esta consideração, procura-se otimizar a distribuição dos esforços, analisando-se integralmente a estrutura e o maciço de solo. O objetivo final é tentar obter recalque diferencial zero, pelo menos na teoria, para que na prática a estrutura sofra o mínimo possível os efeitos da deformabilidade do solo.