Grelha x Vinculação de vigas

Dúvida enviada à Comunidade TQS

Por qual motivo há a necessidade de definir as vinculações de vigas sendo que o próprio modelo (grelha) já nos fornece os esforços dos elementos?

Resposta

A sua questão é natural para todo engenheiro moderno, que busca ao máximo a otimização do seu trabalho e técnicas aplicadas.

Observo esta questão como um confronto entre as facilidades que a tecnologia pode oferecer contra a praticidade e confiabilidade da interferência humana.

1) Recentemente fui a uma loja de telefonia móvel para procurar um aparelho celular. A atendente me mostrou um aparelho com tecnologia Bluetooth (transmissão de dados sem fio) e com comando de voz. Eu não acreditei que funcionaria com tanta precisão, mas ela foi logo ligando o aparelho, apertou um botão e a uma voz feminina e delicada surgiu do celular respondeu dizendo:

- Diga um comando

A vendedora disse:

- Ligar número

A voz disse:

- Diga o número

A vendedora disse:

- 55120771

A voz do celular disse:

- Você disse 55120771

A vendedora disse:

- Sim

... E a ligação foi realizada.

Eu achei uma maravilha, coisa do século 21 mesmo, mas todos que experimentaram acharam que o tempo despendendo para as “declarações” de comandos de voz mais a interpretação destes comandos pelo celular foi maior que o que levamos na “digitação” os 8 dígitos+send do telefone desejado.

2) Agora vamos voltar ao TQS, vejamos o problema que passo hoje. Nestes dias, estou buscando uma solução para duas estruturas de um conjunto habitacional teoricamente normal, onde as arquiteturas dos dois blocos são diferentes em extensão e disposição das garagens, mas com apartamentos semelhantes (cheios de recortes de fachada), com térreo e apenas 9 pavimentos-tipo, onde a diferenciação na disposição de vagas dos 2 edifícios complica a definição de uma estrutura semelhante para os dois.

Já estudei diversas soluções, diversas formas, e depois algumas de horas de trabalho dentro do modelador estrutural, e quando chego na fase de definição de vinculações entre vigas, sinto uma satisfação de curta duração, porque em segundos defino todas as vinculações e tenho que continuar com as verificações de consistência de dados.

3) Agora vamos a sua questão: Porque temos que definir as vinculações entre vigas se já contamos com modelos estruturais que obtém os esforços provenientes do comportamento global da estrutura?

Hoje, estas definições são úteis principalmente para que o TQS-Vigas tenha os vãos, apoios e comprimentos de apoio bem definidos, fundamentais para que o sistema defina os pontos de corte de armaduras positivas e negativas, armaduras de suspensão e ancoragens corretas.

Alguns sistemas computacionais integrados se propõem até a realizar a tratamento das vinculações automaticamente, mas provavelmente não contemplam os tópicos citados acima com a profundidade que o TQS-Vigas trata para o detalhamento.

Aqui na TQS, já discutimos muito esta questão da automação da obtenção das vinculações entre vigas, e ao final destas longas conversas sobre esta questão, sempre ao final eu e alguns outros membros da TQS chegamos à mesma conclusão:

- Esta é uma decisão importante de engenharia, dependente da interpretação do funcionamento estrutural.

Para ilustrar a complexidade do tema vejamos alguns exemplos de modelos estruturais bem simples onde fica latente que a automação não é fácil, se pensarmos que os usuários podem elaborar lançamentos complicados e os diagramas correspondentes:

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Neste caso as vigas V2 e V5 devem ser detalhadas independentemente uma da outra, para conseguir este detalhamento, devemos declarar CRUZAMENTO SIMPLES.

A consideração de CRUZAMENTO SIMPLES também deve ser aplicada ao modelo abaixo, onde temos uma grelha de vigas:

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Agora vamos para um terceiro exemplo, onde temos pilares intermediários (P5 e P6) formando balanços na V5, na ligação com as vigas V1 e V3.

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Reparem que as vigas V1, V2 e V3 se apóiam na V5.

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Agora vamos modificar este modelo, incluindo mais vigas horizontais:

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Podemos agora observar pelos diagramas abaixo que as vinculações declaradas no modelo acima estão erradas, pois as vigas V1 e V6 não se apóiam na V9, apesar do mesmo vão e inércias, porque a distribuição de esforços no pavimento foi modificada pela presença das novas vigas.

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Hoje, poderíamos até encontrar uma solução computacional onde vinculações sugestivas entre vigas fossem obtidas através dos resultados de processamentos globais sucessivos – se lembrarmos das transições de pilares -, mas nos casos como os apresentados acima, as avaliações das vinculações ideais podem ser muito mais complexas do que uma sofisticada lógica computacional pode interpretar.

Caro Edie, a verdade é a seguinte: apesar de estarmos em 2005, eu e boa parte da equipe da TQS julga que ainda é importante o engenheiro-usuário ter controle do projeto que esta elaborando e este controle se materializa com ações como as pequenas definições de vinculação entre os elementos estruturais.

E bom lembrar também que os sistemas, principalmente o TQS-Vigas, que tem recursos para evitar que uma vinculação mal declarada resulte em um detalhamento contra a segurança.

Vejamos o caso da estrutura abaixo, onde podemos reparar que surgem momentos negativos na V1 e V3 no encontro com as vigas V5 e V6:

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Apesar das vinculações equivocadas, o TQS-Vigas transfere os momentos negativos até os apoios mais próximos e detalha uma armadura negativa para combater a estes esforços. Na armadura da viga, podemos observar que as posições N2, N3, N4 se estendem para cobrir os diagramas negativos.

Para finalizar, quando definimos o modelo no TQS, devemos sempre lembrar que às vigas têm que ter pelo menos um apoio para que sejam transferidas do TQS-Formas para o TQS-Vigas e sejam detalhadas.

Nos exemplos, procurei simplificar os esforços, mas em estruturas reais, muitos outros fatores podem interferir nos esforços em uma viga, principalmente quanto às deformações diferenciais entre os pilares provenientes de transições, deformações axiais diferenciadas entre pilares e deformações diferenciais entre fundações.

A definição de vinculações hoje é importante principalmente para que o TQS-Vigas faça um bom detalhamento, e é importante que continuemos a demandar um tempo na análise e interpretação dos resultados, onde a partir dos diagramas obtidos, vislumbrar as vinculações mais apropriadas para cada cruzamento de vigas.

Quem sabe no futuro tenhamos até comandos de voz no TQS, mas até lá vamos continuar a realizar o nosso trabalho em projetos de “maneira tradicional”, sendo que hoje já conseguimos grandes avanços em relação há poucos anos atrás, como substituir os “manteigas” por desenhos de referência, a obtenção de cargas até a fundação por área de influência por modelos integrados de grelha e pórtico espacial, etc.

Um abraço a todos

Luiz Aurélio

TQS Informática Ltda.